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Uma história distante dos derivativos

Posted by Orlando Sampaio em outubro 26, 2008

  Quando se fala em contratos derivativos, imagina-se que este tipo de instrumento é uma invenção do mercado financeiro moderno. Porém, sem ter o nome pomposo, estes tipos de contratos já eram negociados há mais de 2500 anos atrás.

  Tales de Mileto  foi o primeiro filósofo ocidental de que se tem notícia. E em sua época, a filosofia abrangia também o estudo das ciências naturais, entre ela a meteorologia. Com seu conhecimento, ele conseguia prever com certo grau de precisão se a próxima colheita de azeitonas (principal produto da região em que vivia) seria boa ou não.

  Para provar que a filosofia não era inútil como muitos falavam, Algum tempo antes de uma grande colheita que ele havia previsto, Tales ofereceu para todos os donos de prensas da região uma certa quantia em dinheiro para ele ter o direito de usar as prensas na época da colheita. Como a colheita era incerta (ou decidida pelos deuses, conforme se acreditava na época), todos aceitaram, pois prefiriam receber um pequeno valor com certeza do que um valor maior com incerteza (obs: é o que se chama aversão ao risco).

  A colheita, conforme havia previsto Tales, foi bastante farta, e ele controlava todas as prensas da região. Quando os produtores de azeitonas foram alugar as prensas para processar as azeitonas que haviam colhido, Tales pode cobrar quanto queria (um preço justo, claro) e fez uma pequena fortuna com a filosofia.

  Pode-se ver que Tales usou um contrato derivativo de opção, pois ele pagou um certo prêmio para ter um direito futuro.

  Apesar de Tales ter negociado um dos primeiros contratos derivativos que se tem notícia (existem evidências de outros anteriores, inclusive no Mahabharata), foi no Japão, século XVII, que surgiu a negociação organizada de derivativos.

  O porto de Osaka era uma das principais portas de saída da produção de arroz. Nas fronteiras da cidade, alguns negociantes recepcionavam os produtores e compravam sua produção. Estes negociantes vendiam o produto também no porto, para os navios que chegavam para comprar arroz (como as tradings). Conforme o mercado foi crescendo, a informação do preço que o arroz estava sendo comprado de um lado da cidade e por qual preço estava sendo vendido do outro lado precisava circular cada vez mais rápido, para que não houvesse prejuízo para os negociantes. Para isso, eles criaram um engenhoso sistema de comunicação por bandeiras, que informava o preço quase instantaneamente e permitia que o preço de venda no porto superior ao preço de compra na fronteira, de modo a dar lucro aos negociantes sem impedir os negócios.

  A partir de um certo momento, estes negociantes começaram a comprar não só a produção que chegava às fronteiras da cidade, mas também a produção futura dos agricultores, por um preço predeterminado. Surgiam então os primeiros contratos futuros. Estes contratos permitiam que os produtores já soubessem quanto iam receber e os negociantes iam pagar pela próxima safra, independente do preço na data da safra. Como comprovante era emitido uma nota assinada por ambos.

  Logo estas notas começaram a ser também negociadas, transferindo o direito futuro para terceiros. Surgiu então em 1697 o Mercado de Arroz de Dojima, próximo a Osaka, onde se concentraram as negociações de contratos de arroz.

  Em outra parte do mundo, por volta da mesma época, os derivativos ajudaram a criar uma das mais famosas “bolhas especulativas” que se tem notícia. Foi a Mania das Tulipas (Tulip Mania) na Holanda. Por volta de 1637 um contrato de tulipa chegou a ser negociado por 20 vezes o salário anual de um artesão.

Índice de preço das tulipas no periodo 1636-1637

Índice de preço das tulipas no período 1636-1637

  Em um certo momento, a bolha estourou e o preço das tulipas caiu vertiginosamente. Quando chegou o momento de honrar os contratos futuros que haviam sido negociados a preços altíssimos pelos especuladores, as tulipas já valiam um infinitésimo do preço, porém eles teriam que pagar aos produtores o preço que haviam fechado anteriormente. Neste momento recorreram ao governo holandês, que ordenou que os contratos futuros poderiam ser anulados através do pagamento de um valor correspondente a dez por cento do valor total, transformado estes contratos em opções.

  Conforme pode-se notar, os derivativos não são uma novidade do mercado financeiro, porém a avaliação do seu preço só começou a se desenvolver no final dos anos 60. Daí é assunto para outro post…

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